Brasil 3, Paraguai 0.
Bem que eu gostaria que este blog estivesse sendo escrito na
segunda-feira, após o jogo contra o Paraguai, decisivo para o Brasil continuar
na Copa América.
-Mas, não. Estou escrevendo na sexta-feira.
-E estou falando aqui de um jogo acontecido há exatos 46
anos, no dia 17-08-1969, no estádio Defensores Del Chaco, em Assunção.
Eu estava lá, meninos. Eu vi.
Era jogo pela eliminatória para a Copa do Mundo de 1970. O
Brasil havia vencido a Colômbia (2 a 0) e a Venezuela (5 a 0).
Quando a Seleção chegou a Assunção, eu já estava lá há
alguns dias, mandando matérias para o Jornal da Tarde.
Havia uma expectativa muito grande com a chegada da Seleção,
assim como também quanto ao desconhecido Tostão que marcou os dois gols contra a
Colômbia e outros cinco contra a Venezuela.
Era um novo Pelé, perguntavam-me com insistência.
Mas a expectativa não girava apenas em torno do futebol.
Comemorava-se o centenário da Guerra do Paraguai, travada de
1864 até 1870.
É com muito orgulho, mas também com muita tristeza, que os
paraguaios falam dessa guerra.
Enquanto nós comemoramos coragem e a bravura de Duque de
Caixas, os paraguaios apontam o herói brasileiro com carrasco sem alma,
aniquilador de mulheres e crianças.
Deu-se, portanto, aos paraguaios, o caráter nacionalista do
encontro.
Os paraguaios acreditavam que tinham um grande time e que
poderiam se vingar do Brasil.
Os programas esportivos de rádio eram precedidos do Hino
Nacional paraguaio; os brasileiros não eram adversários, mas, sim inimigos cruéis
a serem batidos.
A imprensa local botou fogo nos ânimos.
A concentração brasileira, numa mansão num bairro chique de
Assunção, era assombrada à noite com veículos e motos em buzinaços e carreatas.
Foi preciso intervenção policial.
O dono da mansão fez uma visita de cordialidade à delegação
brasileira e levou seus dois cães de raça para mostrá-los, com orgulho.
No dia seguinte, o principal jornal de lá, o ABC Color, trouxe
fotos dos cães na primeira página dizendo que os brasileiros haviam levado os
dois animais para manter os paraguaios à distância.
O clima que se criou foi dos mais pesados.
João Saldanha era o técnico e ameaçava, nas entrevistas,
exigir que a CBD (a CBF de então) marcasse o jogo de volta para a acanhada cidade
de Nova Lima, em Minas Gerais. Lá, dizia, eles iriam enfrentar o alçapão do
Bonfim, como era conhecido o campo do Vila Nova.
E eu era chamado a explicar o que era “alçapão”, “Nova Lima”
e “Vila Nova” aos companheiros jornalistas paraguaios.
Um jornalista e um fotógrafo de um jornal escandaloso de lá
chegaram a tentar aramar uma cena pra cima do Saldanha.
O repórter provocou ao máximo o esquentado João Saldanha,
enquanto o fotógrafo, ao longe, com a objetiva focada, esperava a agressão do
técnico brasileiro.
Eu percebi a armação e gritei: é armação!
Quando Saldanha percebeu, aí é que ele teve mais vontade de
bater no repórter. Mas, felizmente, isso não aconteceu.
No domingo, o estádio Defensores Del Chaco estava completamente
lotado. Os paraguaios faziam festa e gritavam palavras de ordem nacionalistas.
Pouco antes de o jogo começar, Saldanha mandou que a Seleção
entrasse em campo e desse uma volta no gramado. Foi a maior vaia que eu ouvi em
toda a minha vida.
Funcionou exatamente como Saldanha queria.
O Brasil entrou em campo suando brios, desafiado.
Nos primeiros minutos, o Brasil não jogo nem deixou o
Paraguai jogar: distribuiu porradas.
Depois, com os adversários devidamente acalmados, o time
brasileiro botou a bola no gramado e fez o que sabia fazer muito bem: jogar. E
jogar muito.
Ganhou por 3 a 0, sem o menor susto.
O primeiro gol foi d apavorado zagueiro Valentín Mendoza.
Jairzinho e Edu completaram.
Naquela época, o capitão Carlos Alberto, que jogava no
Santos, era minha melhor fonte de informação. Ele me contou o que aconteceu no
vestiário, antes do jogo.
- O João mandou que gente entrasse em campo bem antes do
jogo começar. Foi a maior vaia que já levamos. Quando voltamos, ele fez a
preleção e disse o seguinte: durante a semana toda esses caras encheram nosso
saco; atrapalharam a gente dormir, falaram um monte de asneiras a nosso
respeito. Na hora do jogo, Vocês vão escutar isso aí, todas essas vaias. Vão
pra campo e faz aquilo que Vocês sabem fazer: jogar futebol. E jogar muito.
Vamos dar uma lição nesses caras. E tem mais: nenhum juiz expulsa ninguém com
menos de 10 minutos de jogo. Entenderam?
Foi à senha para a pancadaria dos dez minutos iniciais.
Eis o time brasileiro: Felix (Fluminense); Carlos Alberto
(Santos), Djalma Dias (Santos), Joel Camargo (Santos) e Rildo (Santos); Piazza
(Cruzeiro) e Gérson (Botafogo); Jairzinho (Botafogo), Tostão (Cruzeiro), Pelé
(Santos) e Edu (Santos).
Ah!, Vocês estão perguntando quem é essa menininha bonitinha da foto lá
em cima. É a Larissa Riquelme, da Copa do Mundo de 2010, lembram-se? É uma
homenagem aos paraguaios.

Muito boa a reconstituição daquele Brasil x Paraguai, Marinho!
ResponderExcluirVocê é História, com agá maiúsculo!
Gostei muito de ler esse seu depoimento.
Abs.
Toinho
O comentário acima foi feito pelo amigo Toinho Portela, companheiros dos velhos e bons tempos do Jornal da Tarde.
Excluir