sexta-feira, 26 de junho de 2015



Brasil 3, Paraguai 0.

Bem que eu gostaria que este blog estivesse sendo escrito na segunda-feira, após o jogo contra o Paraguai, decisivo para o Brasil continuar na Copa América.

-Mas, não. Estou escrevendo na sexta-feira.

-E estou falando aqui de um jogo acontecido há exatos 46 anos, no dia 17-08-1969, no estádio Defensores Del Chaco, em Assunção.

Eu estava lá, meninos. Eu vi.

Era jogo pela eliminatória para a Copa do Mundo de 1970. O Brasil havia vencido a Colômbia (2 a 0) e a Venezuela (5 a 0).

Quando a Seleção chegou a Assunção, eu já estava lá há alguns dias, mandando matérias para o Jornal da Tarde.

Havia uma expectativa muito grande com a chegada da Seleção, assim como também quanto ao desconhecido Tostão que marcou os dois gols contra a Colômbia e outros cinco contra a Venezuela.

Era um novo Pelé, perguntavam-me com insistência.

Mas a expectativa não girava apenas em torno do futebol.

Comemorava-se o centenário da Guerra do Paraguai, travada de 1864 até 1870.

É com muito orgulho, mas também com muita tristeza, que os paraguaios falam dessa guerra.

Enquanto nós comemoramos coragem e a bravura de Duque de Caixas, os paraguaios apontam o herói brasileiro com carrasco sem alma, aniquilador de mulheres e crianças.

Deu-se, portanto, aos paraguaios, o caráter nacionalista do encontro.

Os paraguaios acreditavam que tinham um grande time e que poderiam se vingar do Brasil.

Os programas esportivos de rádio eram precedidos do Hino Nacional paraguaio; os brasileiros não eram adversários, mas, sim inimigos cruéis a serem batidos.

A imprensa local botou fogo nos ânimos.

A concentração brasileira, numa mansão num bairro chique de Assunção, era assombrada à noite com veículos e motos em buzinaços e carreatas.

Foi preciso intervenção policial.

O dono da mansão fez uma visita de cordialidade à delegação brasileira e levou seus dois cães de raça para mostrá-los, com orgulho.

No dia seguinte, o principal jornal de lá, o ABC Color, trouxe fotos dos cães na primeira página dizendo que os brasileiros haviam levado os dois animais para manter os paraguaios à distância.

O clima que se criou foi dos mais pesados.

João Saldanha era o técnico e ameaçava, nas entrevistas, exigir que a CBD (a CBF de então) marcasse o jogo de volta para a acanhada cidade de Nova Lima, em Minas Gerais. Lá, dizia, eles iriam enfrentar o alçapão do Bonfim, como era conhecido o campo do Vila Nova.

E eu era chamado a explicar o que era “alçapão”, “Nova Lima” e “Vila Nova” aos companheiros jornalistas paraguaios.

Um jornalista e um fotógrafo de um jornal escandaloso de lá chegaram a tentar aramar uma cena pra cima do Saldanha.

O repórter provocou ao máximo o esquentado João Saldanha, enquanto o fotógrafo, ao longe, com a objetiva focada, esperava a agressão do técnico brasileiro.

Eu percebi a armação e gritei: é armação!

Quando Saldanha percebeu, aí é que ele teve mais vontade de bater no repórter. Mas, felizmente, isso não aconteceu.

No domingo, o estádio Defensores Del Chaco estava completamente lotado. Os paraguaios faziam festa e gritavam palavras de ordem nacionalistas.

Pouco antes de o jogo começar, Saldanha mandou que a Seleção entrasse em campo e desse uma volta no gramado. Foi a maior vaia que eu ouvi em toda a minha vida.

Funcionou exatamente como Saldanha queria.

O Brasil entrou em campo suando brios, desafiado.

Nos primeiros minutos, o Brasil não jogo nem deixou o Paraguai jogar: distribuiu porradas.

Depois, com os adversários devidamente acalmados, o time brasileiro botou a bola no gramado e fez o que sabia fazer muito bem: jogar. E jogar muito.

Ganhou por 3 a 0, sem o menor susto.

O primeiro gol foi d apavorado zagueiro Valentín Mendoza. Jairzinho e Edu completaram.

Naquela época, o capitão Carlos Alberto, que jogava no Santos, era minha melhor fonte de informação. Ele me contou o que aconteceu no vestiário, antes do jogo.

- O João mandou que gente entrasse em campo bem antes do jogo começar. Foi a maior vaia que já levamos. Quando voltamos, ele fez a preleção e disse o seguinte: durante a semana toda esses caras encheram nosso saco; atrapalharam a gente dormir, falaram um monte de asneiras a nosso respeito. Na hora do jogo, Vocês vão escutar isso aí, todas essas vaias. Vão pra campo e faz aquilo que Vocês sabem fazer: jogar futebol. E jogar muito. Vamos dar uma lição nesses caras. E tem mais: nenhum juiz expulsa ninguém com menos de 10 minutos de jogo. Entenderam?

Foi à senha para a pancadaria dos dez minutos iniciais.

Eis o time brasileiro: Felix (Fluminense); Carlos Alberto (Santos), Djalma Dias (Santos), Joel Camargo (Santos) e Rildo (Santos); Piazza (Cruzeiro) e Gérson (Botafogo); Jairzinho (Botafogo), Tostão (Cruzeiro), Pelé (Santos) e Edu (Santos).


Ah!, Vocês estão perguntando quem é essa menininha bonitinha da foto lá em cima. É a Larissa Riquelme, da Copa do Mundo de 2010, lembram-se? É uma homenagem aos paraguaios.

2 comentários:

  1. Muito boa a reconstituição daquele Brasil x Paraguai, Marinho!
    Você é História, com agá maiúsculo!

    Gostei muito de ler esse seu depoimento.

    Abs.

    Toinho

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    1. O comentário acima foi feito pelo amigo Toinho Portela, companheiros dos velhos e bons tempos do Jornal da Tarde.

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